Por que permanecemos em um relacionamento?

Por que permanecemos em um relacionamento?

Esses dias uma amiga querida perguntou o que era “dar certo” com alguém. E eu pensei o quanto dar certo está ligado à duração, a um check-list que a gente preenche como plaquinhas que os funcionários exibem orgulhosos: 1 ano, 5 anos, 10, 15, 30. Como o que casais comemoram, muitos genuinamente, pelo marco temporal de suas vidas juntos.

Dar certo significaria então, para a maioria das pessoas, durar, contrariando que relações saudáveis também terminam, contrariando que duas pessoas incríveis nem sempre são incrivelmente boas juntas e, nesse caso, dar certo é não dá mais. Eu mesma tenho relações até mais bonitas com quem decidi não conviver.

Foi há um tempo que percebi que dar certo para mim era pelo tempo que durar (que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure, como já disse Vinicius de Moraes), mas que esse tempo devia dar certo para mim, não para o outro. Isso bagunça bastante a lógica e inclui uma perspectiva egoísta nas decisões (existe alguma que não é?).

Essa ficha só caiu quando dei conta que a quantidade de relações terríveis que eu poderia ter era inversamente proporcional ao tempo de vida que me restava. Se eu quisesse ter uma vida satisfatória precisaria avaliar minhas relações – todas elas. As amorosas, as profissionais, de amizade. A que estabeleço com casas e cidades onde moro, com os serviços que contrato. Somos seres profundamente relacionais e eu descobri que elas definem meu equilíbrio.

Ao longo dos anos – e não sozinha – cheguei a 4 pontos capazes de responder se uma relação vale a pena. De existir ou continuar. Vez ou outra coloco relações (que posso escolher) à prova dessas quatro perguntinhas que, longe de serem apaziguadoras, já fizeram misérias aqui dentro:

Há fluidez? Há reciprocidade? Há confiança? E respeito?

Confesso que o tempo se mostra aliado nas avaliações, mas esses pontos não estão necessariamente ligados à duração. Tive empregos de 1 ano que geraram memórias mais bonitas que outros em que bati cartão chorando por 4. Da mesma forma tenho amigos que chegaram há pouco com quem fluo mais do que com aqueles cuja capacidade de dar certo esfriou há muitas estações.

Talvez por isso eu tenha uma estranha habilidade de abandonar velhas roupas sem olhar para trás. Claro que há relações que me embaralham, mesmo que diante dela eu já tenho feito essas quatro perguntas respondendo não a cada uma. Mas ainda estou na faixa dos 30 e me dou o direito de errar, são esses erros que tornam minha caminhada mais sábia, mais humana, menos mecânica.

Ainda sim as quatro perguntas fazem sentido nos meus contextos. Ainda sim sigo em busca de relações fluidas, em que a entrega é equilibrada. Relações em que acredito no outro, não por criar expectativas, mas pela esperança que ele, o outro, cumpra o pacto que estabeleci como essencial para realizar essa entrega. Essa confiança é quase mística.

Por fim, não acho que exista relação sustentável sem respeito. E todos nós deveríamos ter condições de nos retirarmos quando ele deixa de ser colocado à mesa, mas há muitas questões – inclusive sociais – atravessadas aí. Nem sempre sair de relações é algo fácil, nem sempre contamos com independência e maturidade para abandonar o que nos serve mais.

Entender o que se torna insustentável numa relação para ter a chance de se despedir antes que ela nos desmorone – ou até depositar menos energia nesse outro, quem sabe – é algo bastante pessoal. E encontrar essas respostas talvez seja um caminho. Uma forma saudável de se relacionar consigo mesmo. 

Tatiana Lazzarotto é escritora, jornalista e mestranda em Estudos Culturais pela USP. Leia mais textos no instagram: @tatiana.lazzarotto.